porque não escrevo assiduamente neste blogue
A mais velha chega a casa a chorar desalmadamente por causa de mais uma picuinhice com o emplastro. Depois de uma hora de soluços audíveis e de "não quero falar com ninguém", chega o emplastro e, presumivelmente, fazem as pazes. O do meio chega a casa e trás consigo uma matilha de emplastros borbulhentos e espinafrudos que quase batem com a cabeça no tecto. Mochilhas atiradas ao calhas. Baixos, guitarras eléctricas e baterias a serem afinados no quarto. Coisas que caem, gargalhadas alarves, outras que batem contra a parede, não quero nem saber. Do que se passa no quarto da filha mais velha, à porta fechada, ainda quero saber menos. O mais novo chega da escola cheio de fome. Numa hora, uma caixa de cereais e um litro de leite vão à vida. Traz consigo um amigo nerd cuja única qualidade é comer pouco. Os aspirantes a banda de garagem assaltam a cozinha em me vendo de costas. As pizzas congeladas do pingo doce, compradas para uma ocasião de extremo cansaço em que não me apeteça cozinhar, vão todas. Só dou por falta delas muito depois, na tal ocasião de extremo cansaço, claro. Filha mais velha pergunta se namorado emplastro pode cá jantar. E se a amiga que está a chegar, também. Os adolescentes de barriga cheia resolvem descer à garagem para ver a aprilia nova do filho do meio. Não podem sair dali porque ele ainda não tem carta e andam às voltas lá dentro. Vizinhos a queixarem-se de que eles são muitos, fazem muito barulho e que não fecham a porta de acesso à garagem, pondo em causa a segurança do prédio. Voltam a subir, dou-lhes uma esfrega que lhes entra pelo cérebro (que na verdade ainda não têm), lhes atravessa o corpo e sai directamente para a terra, como uma descarga eléctrica sem dor nem consciência. Voltam aos Led Zepellin (que devem estar a rebolar na campa, ou lá no sítio onde estão, coitados). Chega a amiga emplastra, fecham-se os três no quarto a ver um filme. A partir das sete, começa o mantra caseiro, que se repete de cinco em cinco minutos: "Mãe, o jantar já está pronto?". Tapo os ouvidos e entro no hard rock café: "Quem fica para jantar?". "Mãe, se não te importares o castro janta cá e depois vamos às esplanadas". O nerd fica cá a dormir, isso já sei, está com o mais novo numa outra dimensão, a jogar online com um paquistanês e uns suecos. Faço contas à vida, abro o frigorífico. Sustância, népia. Ao todo, somos oito. Saio à pressa para o talho, quero 16 hamburgueres. Chego a casa, o mantra a repetir-se vezes sem conta, vindo de todas as partes da casa, as vozes ecoam na minha cabeça, numa onda esquizofrénica. Jantar, jantar, jantaaaaar!...Esparguete para a panela, hamburgueres com cogumelos e natas, 15 minutos (sou mais rápida que uma bimba, acreditem). Cada grupelho quer comer na sua zona de conforto. Tabuleirinhos para todos com os respectivos regrigerantes a gosto, guardanapos, talheres. Uma trabalheira para eles, que têm de vir buscar o seu tabuleiro à cozinha. Como é que é possível, eu não lhes levar a comida aos quartos? Comem em cinco minutos, louça na máquina. mais uma corrida para ver se a aprilia ainda está no lugar e irem às "esplanadas", onde pedem uma jola para todos (isto sou eu em negação, deixem lá). Filho mais novo e amigo nerd mostram resistência à àgua e dá-se início a um complexo processo de negociação que mete banho antes de irem para a cama. Mais meia hora de nerdice no pc, mais uma dúzia de zombies mortos. ok. Amiga da mais velha vai-se embora e os outros dois continuam no quarto, a ver o resto do filme (isto também sou eu em negação, mas pronto). Entra o mais velho às onze, disparado porta dentro (é sempre assim) com a tropa acneica: vieram buscar as mochilas, de que se esqueceram. Eu, de roupa interior a vestir o pijama, só tenho tempo de me atirar para a porta do quarto. Já composta, ponho-os a todos na rua, com um ultimato de cinco minutos e mando os nerds para o banho. Bato à porta da mais velha e espero muuuito tempo até a abrir (em negação, mas não parva). Dou mais meia hora ao emplastro, porque amanhã é dia de faculdade. "Oh mãe, é só acabar o filme...". Olho para a televisão e estão a ver o Saw III: Já se sabe como acaba: morrem todos cortados aos bocados portanto, dentro de meia hora, andor. Espero que as hordas se retirem enquanto acabo de arrumar a cozinha e penso seriamente em transformar a minha casa numa pousada da juventude. Pode ser que saque alguns fundos comunitários ou isso. Por volta da meia-noite, quando começo a abancar no sofá, dá-lhes para me virem, à vez, contar os problemas do dia. O que normalmente é eufemismo para ceia. Leites com chocolate, "Ficam melhores quando és tu a fazer, mãe!" (sacanas!) e pão com manteiga (quando sobra algum,, o que é raro). À uma já sei que o G chinou o D, que a B voltou a andar com o C, que o setôr de informática é um retardado mental e que tenho recados para assinar por "falar demais nas aulas". De ambos os rapazes em colégios distintos (deve ser um gene). Isto tudo, portanto, começa depois de um dia de trabalho que acaba às seis. Percebem agora?