morte anunciada
Ao almoço, eu em frente a uma posta de bacalhau com grão e a um televisor na sport tv, onde acontecia um jogo do mundial entre dois países de louros, não percebi quais. O som, posto baixinho, dava para apreender um apitadela mais vigorosa do árbitro e era tudo. Nem palmas, nem assobios, nem exclamações colectivas de alegria, de desgosto ou de susto. De fundo, um ruído que primeiro pensei ser do ar condicionado, depois, das arcas refrigeradoras do próprio restaurante (uma espécie de cervejaria de bairro). Por pouco, não pedia ao Sr. Gil que, para além de me trazer outra imperial, me silenciasse o bicho, que aquilo já me estava a ir aos nervos. Era uma moinha constante, um béeeeeeeee ao longe que parecia abafar todos os outros sons. Foi então que me apercebi: o som vinha do jogo e era o coro infernal das vuvuzelas, só podia. E eu, que nunca antes tinha ouvido aquilo, nem uma nem mil, fiquei chocada, sinceramente. Mas como é que os jogadores conseguem fazer alguma coisa com aquela merda a zunir-lhes nos espíritos, incessantemente? Além de que, como espectador, estar sempre a ouvir aquilo é como respirar uma atmosfera estragada: sobrevive-se, mas o ambiente fica fodido. A solução é ver os jogos em silêncio, ou quase, para não enlouquecer - o que é de certa forma um paradoxo. Embora prognósticos só no fim do jogo, quer-me parecer que as putas das vuvuzelas acabaram com o espectáculo e mataram este mundial.