as rotundas dos comunistas
As autarquias de esquerda, em especial as comunistas, têm um gosto horrível no que concerne à arte pública e ao mobiliário urbano. Eu não tenho qualquer explicação para isto, mas vou tentar (what´s new?). As rotundas (e o que eles gostam de rotundas!) são quase sempre delírios de fúria criativa artesanal, de artistas sem génio mas com cartão vitalício do partido ou, então, primos ou amigados de alguém do mesmo partido. Que concebem coisas retorcidas em aço e pedra que supostamente representam os símbolos da "terra" e as forças vivas da região, cubos de cimento e tumores gigantescos de relva que tapam qualquer visibilidade e que tornam a entrada e saída das ditas rotundas numa espécie de roleta russa, completamente às cegas. Mas pior são os jardins. Estes novos jardins, meu deus!, são sítios onde não apetece estar. Imaginados (?) por gente que não dá valor ao lazer, ao ócio, ao pipilar da bicharada: em suma, à função de refúgio que os jardins devem ter dentro de uma cidade ou vila. Agora estão na moda os descampados imensos, e verde, só se for relva, sendo que os arquitectos paisagistas teimam em plantar árvores ainda em tamanho de arbusto, a um metro uma das outras para ficar "bonitinho", só para mais tarde terem de ser arrancadas, quando se começam a estrangular umas às outras pela raiz ou pelas copas. Os bancos são invariavelmente paralelipípedos de cimento sem costas, o que dá muito jeito às cruzes dos pobres velhinhos, que são os principais clientes dos mesmos, pois gostam de apanhar solinho uns com uns outros enquanto se queixam da vida. Para aquela gente, a função de um banco de jardim não é permitir o relaxe nem o descanso, claro; e qual anatomia, qual quê: vê-se mesmo que imitaram uma merda qualquer que viram numa revista estrangeira de arquitectura, construída num país do norte da Europa, daqueles sem sol nem arabescos, mas com muito frio e muitos ângulos rectos. E as fontes? Oh, quanto haveria a dizer sobre as fontes! É certo que não precisaríamos de uma Fontana di Trevi em cada freguesia, mas há necessidade de pôr águas invariavelmente mal-cheirosas a escorrer e a jorrar de sólidos geométricos de betão? Seria assim tão demodée, tão fascista e reaccionário, fazer qualquer coisa para gente de verdade e, já agora, com figuras reconhecíveis e não abstractas? Com pessoas, por exemplo? Animais? Se calhar, sim, seria: afinal, todos sabemos que reproduzir a forma humana, ou outras já existentes na natureza, é difícil: há que ter olho, arte e aquilo a que se chama "motricidade fina". Lembro-me sempre da história daquela senhora, natural de uma aldeia que conheço bem, que esculpiu o famoso "cauteleiro", e que só é famoso porque pespegaram com ele no Largo da Misericórdia. A dita senhora, um exemplo acabado de falta de gosto e talento, é sempre recebida com pompa e circunstância quando regressa à terrinha, e parece que até já doou mais uma ou duas das suas obras para compôr a paisagem urbana local. O que é chocante. Quem já viu de perto o "cauteleiro", quem já andou por ali pela misericórdia e olhou aquela amálgama mal-parida de bronze, percebe esta minha indignação, juro que percebe. Por isso, artistas/paisagistas/irmãos de presidentes de câmara ou filhos de presidentes de junta, amigados de todos os tipos, desde que conservadores e da velha escola, apologistas do banco de jardim de ripas anatómicas, dos repuxos e das fontes em pedra, das árvores de copas grandes e frescas, e de um ou outro apontamento neo-clássico sabiamente disposto por entre o verde: ao Poder, já!