atravesso a praia de Vilamoura e aterro, incauta, no novo conceito de “férias com glamour” para os que “querem aparecer”: o “Nikki Beach” de um lado e o “Sasha” do outro, sendo que, em ambos os casos, apenas um adjectivo me ocorre: pindérico. É de uma pinderiquice pegada, o novo sonho de um dia de Verão dos casalinhos portugueses que querem ser como os dos revistas; elas, como as Merches, as Pituxas, as Cinhas, as “Moranguitas”, as Sorayas, as Ritas e as Dianas; e eles, como os fefês e os jotapecês, que exibem duvidosas masculinidades bronzeadas. Ali estão, meia dúzia de deslumbrados de shot na mão, alcandorados nas chaise longs e nas camas palafitadas, envoltos em mosquiteiros, convenientemente resguardados do “incómodo” que é a areia (como dizia uma entrevistada), à espera da “massagem”, enquanto ouvem (eles, e a praia toda) trance-dance-house-ou-lá-o-que-é-aquilo (tum-tum-tum-tum), numa doce ilusão bacoca de “luxo”, “glamour” e “modernidade”. É certo que cada um se diverte como quer, e se alguns se divertem a largar dezenas de euros para os bolsos de uns espertalhões que inventaram o “conceito” de “praia privada” e lhes impingem uma pobre imitação da polinésia francesa ao lado do pontão de Quarteira, então, que o façam, e todos ficam felizes. O pior é que o exibicionismo que, necessariamente, acompanha esta suposta “exclusividade paga” implica a privatização das praias e o seu “barramento” à plebe, que somos nós que, armados de pás, baldes, colchões, e garrafas de água fresca, queremos apenas espojar-nos na areia e nas águas caldas algarvias, como pobres não privilegiados que somos. Estavam quarenta graus. E uma corda proibitiva seguia ao longo da praia em frente ao Tivoli Marinotel. Tivemos que andar e andar e andar, até termos acesso ao areal e ao oceano. E, mesmo assim, relegados para a beira-mar, proscritos, que acima da linha da maré só os “ricos”, os “bem-nascidos”, os privilegiados, - ou seja, os pacóvios. Vem-me à mente uma imagem dessa manhã: o espertalhaço do “Gigi”, o do famoso peixe-fresco-trazido-directamente-à-praia-pelos-pescadores, o do Ancão, a abastecer-se na lota de Quarteira. Ao contrário do que dizia um dos “promotores do projecto em Portugal”, na televisão, aquela não é gente da classe média-alta (esses, a essa hora, andavam nos iates), mas sim da classe média-a-cair-para-o-baixo, que não se importa de gastar o que tem para viver a breve ilusão de que também tem vida de “revista”, de “rico”, e que, por isso, também merece ser servida por criados de bandeja e massajada por meninas de umbigos bronzeados, à sombra de repuxos de água fresca, almofadas e mosquiteiros brancos. Gente que não entende que o verdadeiro “luxo” não se consegue com alguns voiles a tapar um pontão, nem com não sei quantos decibéis a abafar o arrulho do mar e meia dúzia de algarvios bronzeados e subservientes. É que, em não se podendo pagar a verdadeira polinésia francesa, o verdadeiro “luxo” está ali mesmo ao lado, numa sardinhada acompanhada de batatas com pele e regada a imperiais, com vista para uma das praias escondidas da Ria Formosa, ou mesmo numa qualquer praia solitária e ventosa da nossa costa mais a norte e ainda por descobrir. Isso é que é luxo e “exclusividade”. E é grátis, ainda por cima (porque nem tudo o que é bom tem de ser pago a preço de ouro).
atravesso a praia de Vilamoura e aterro, incauta, no novo conceito de “férias com glamour” para os que “querem aparecer”: o “Nikki Beach” de um lado e o “Sasha” do outro, sendo que, em ambos os casos, apenas um adjectivo me ocorre: pindérico. É de uma pinderiquice pegada, o novo sonho de um dia de Verão dos casalinhos portugueses que querem ser como os dos revistas; elas, como as Merches, as Pituxas, as Cinhas, as “Moranguitas”, as Sorayas, as Ritas e as Dianas; e eles, como os fefês e os jotapecês, que exibem duvidosas masculinidades bronzeadas. Ali estão, meia dúzia de deslumbrados de shot na mão, alcandorados nas chaise longs e nas camas palafitadas, envoltos em mosquiteiros, convenientemente resguardados do “incómodo” que é a areia (como dizia uma entrevistada), à espera da “massagem”, enquanto ouvem (eles, e a praia toda) trance-dance-house-ou-lá-o-que-é-aquilo (tum-tum-tum-tum), numa doce ilusão bacoca de “luxo”, “glamour” e “modernidade”. É certo que cada um se diverte como quer, e se alguns se divertem a largar dezenas de euros para os bolsos de uns espertalhões que inventaram o “conceito” de “praia privada” e lhes impingem uma pobre imitação da polinésia francesa ao lado do pontão de Quarteira, então, que o façam, e todos ficam felizes. O pior é que o exibicionismo que, necessariamente, acompanha esta suposta “exclusividade paga” implica a privatização das praias e o seu “barramento” à plebe, que somos nós que, armados de pás, baldes, colchões, e garrafas de água fresca, queremos apenas espojar-nos na areia e nas águas caldas algarvias, como pobres não privilegiados que somos. Estavam quarenta graus. E uma corda proibitiva seguia ao longo da praia em frente ao Tivoli Marinotel. Tivemos que andar e andar e andar, até termos acesso ao areal e ao oceano. E, mesmo assim, relegados para a beira-mar, proscritos, que acima da linha da maré só os “ricos”, os “bem-nascidos”, os privilegiados, - ou seja, os pacóvios. Vem-me à mente uma imagem dessa manhã: o espertalhaço do “Gigi”, o do famoso peixe-fresco-trazido-directamente-à-praia-pelos-pescadores, o do Ancão, a abastecer-se na lota de Quarteira. Ao contrário do que dizia um dos “promotores do projecto em Portugal”, na televisão, aquela não é gente da classe média-alta (esses, a essa hora, andavam nos iates), mas sim da classe média-a-cair-para-o-baixo, que não se importa de gastar o que tem para viver a breve ilusão de que também tem vida de “revista”, de “rico”, e que, por isso, também merece ser servida por criados de bandeja e massajada por meninas de umbigos bronzeados, à sombra de repuxos de água fresca, almofadas e mosquiteiros brancos. Gente que não entende que o verdadeiro “luxo” não se consegue com alguns voiles a tapar um pontão, nem com não sei quantos decibéis a abafar o arrulho do mar e meia dúzia de algarvios bronzeados e subservientes. É que, em não se podendo pagar a verdadeira polinésia francesa, o verdadeiro “luxo” está ali mesmo ao lado, numa sardinhada acompanhada de batatas com pele e regada a imperiais, com vista para uma das praias escondidas da Ria Formosa, ou mesmo numa qualquer praia solitária e ventosa da nossa costa mais a norte e ainda por descobrir. Isso é que é luxo e “exclusividade”. E é grátis, ainda por cima (porque nem tudo o que é bom tem de ser pago a preço de ouro).