minha querida,Estás terminantemente proibida de fazeres o disparate que eu fiz e de acabares com qualquer um dos teus blogues. Eu explico-te porquê. Como bem sabes, as pessoas raramente são o que parecem: quando as conhecemos, trazem já o lastro de muita outra gente agarrado às suas caudas. Esses, os que vêm a reboque dos que entram nas nossas vidas assim como
cometas, entendem que
antiguidade é post(o) e arrogam-se
coisas.
Direitos. Quer sejam gentis e generosos ou invejosos e ressabiados, escrutinam-nos e esmiuçam-nos, na busca de vestígios palpáveis desse
cometa a que resolveram um dia atrelar-se. E nós, entretanto, algures na nossa vidinha, a brincarmos aos afectos (sejam eles de que natureza forem) com o
cometa. Tu, portanto,
na tua: sem saberes que existem movimentações várias na retaguarda, sem sonhares com estratégias que se acertam, por parte de quem presume saber sobre ti, à conta da exposição por que um dia optaste.
Tu,
a leste (sempre a leste), continuas a escrever, apenas (pensas tu e bem) para os que gostam de ti ou, pelo menos, para os que
gostam do que escreves. Não queres saber de maquinações nem de conspirações, nem, muito menos, de
quem sabe o quê sobre quem e para quê. Continuas a escrever e a falar sobre a tua pessoa e aqueles de quem mais gostas, bem como sobre as pequenas e grandes coisas que te vão acontecendo. Dás opiniões. Estás-te nas tintas para que te dissequem vírgulas e sentidos, e até achas graça a que te roguem pragas por viveres à tua maneira. Até que, um dia, surge uma criatura obscura que nem nome tem, na posse de coisas que seriam só tuas e, eventualmente, de outrém. Coisas que em si nada são e que tu sabes não vir grande mal ao mundo que se saibam, não fosse dar-se o caso de serem bocados do teu interior, ruminados vezes sem conta nas tuas entranhas, digeridos com os teus quimo e quilo, oxigenados nos teus pulmões. Sentes-te devassada, violada, virada do avesso; foste vítima de uma cirurgia invasiva, a sangue-frio. Saberes que
aquele alguém sabe aquilo é muito pior do que
aquilo (que nem segredo é) ter saído nas parangonas de todos os jornais diários do país. É uma sensação horrível. Porque tu nunca te importaste um corno sobre o que pudessem dizer de ti, nem que te chamassem nomes, que te invejassem e criticassem, que escarrapachassem quem és, onde moras e onde trabalhas - com isso sempre pudeste bem, até porque pouco ou nada tens a esconder. Agora, a baba e ranho que te corre por dentro, nas veias, tu é que escolhes, onde e quando a verter para fora - TU, e não outros.
Urge-te, por isso, pores um ponto final em qualquer coisa, sentes-te até ligeiramente culpada pelo que aconteceu, de alguma maneira ter-lhe-ás dado azo. Parece-te deveras importante, o assalto que sofreste, foste traída e queres livrar-te a todo o custo do fedor da intrusão que se te colou à pele. Mas não te esqueças,
minha querida: o cometa, por esta altura, já lá vai espaço fora, com a gente do costume pendurada, a reboque da vida alheia, numa relação de simbiose que lembra a dos animais,
coças-me o lombo, dou-te um insecto. Enquanto tu, continuas com a tua vida: razoavelmente feliz, cheia, independente, inspirada, a achares que o que escreves só é lido por quem te gosta,
que essa é a verdade só a verdade e nada mais do que verdade.
E é mesmo:
o que escreves só é lido por quem te gosta. Repara, este
post, por exemplo,
é só para ti. É ou não é? E, na nossa vida, este espacinho limitado por fronteiras curtas mas carregadinhas de guardas republicanos atentos ao contrabando, só deve haver lugar para quem nos gosta e vice-versa.
O resto é paisagem: paisagem desbotada, cócegas no coração, névoas matinais e caudas de cometa.
Puf!:)