Dance me to your beauty with a burning violin Dance me through the panic 'til I'm gathered safely in Lift me like an olive branch and be my homeward dove Dance me to the end of love Oh let me see your beauty when the witnesses are gone Let me feel you moving like they do in Babylon Show me slowly what I only know the limits of Dance me to the end of love Dance me to the wedding now, dance me on and on Dance me very tenderly and dance me very long We're both of us beneath our love, we're both of us above Dance me to the end of love Dance me to the children who are asking to be born Dance me through the curtains that our kisses have outworn Raise a tent of shelter now, though every thread is torn Dance me to the end of love Dance me to your beauty with a burning violin Dance me through the panic till I'm gathered safely in Touch me with your naked hand or touch me with your glove Dance me to the end of love
As mulheres são geralmente tidas como seres complicados, mas são-no apenas porque os homens não falam, ou falam pouco. Esta é uma sinergia (ou uma falta dela) que se verifica desde o início dos tempos. Vejamos Adão e Eva. Aquilo foi a história do costume: boy meets girl born from boy´s rib, trocam números de telemóvel, na minha árvore ou na tua, ela a fazer-se rogada e a fingir que finta a serpente, ele a acabar por comer a maçã, uma, duas, três vezes, enfim, um festim. Logo depois começam os problemas. Enquanto Adão fuma um cigarro enrolado à mão e pensa na eficácia das armadilhas para coelhos que inventou no dia anterior, Eva pergunta, Gostaste?. Claro, responde-lhe Adão (é evidente que gostei, que raio de pergunta, se não, não estava aqui). O laconismo não satisfaz Eva, que não desarma. Mas gostaste mesmo da minha maçã? Quanto é que gostaste? Numa escala de um a dez quanto é que lhe dás? E Adão, já chateado que nem um peru com o interrogatório que o obriga a fazer contas de cabeça com o único neurónio de que Deus o dotou, espera que o assunto morra ali com a sua sinceridade, Gostei muito, mas por acaso gosto mais das bravo-esmolfe, são mais docinhas, apesar de estarem pela hora da morte. Aquilo que é a mera constatação de uma preferência inocente, é visto por Eva como uma ofensa pessoal e um sintoma de rejeição. Ao princípio, ainda tenta esmiuçar a preferência de Adão, esforçando-se por compreendê-la (no que seria imitada por todas as fêmeas vindouras). Mas porque é que preferes as bravo? A minha não era doce? E onde é que ficaste ontem até às tantas? Perante a incapacidade de resposta por parte de Adão (que bloqueia, bombardeado com tanto pedido de informação ao mesmo tempo, como um PC dos antigos) segue-se a vingança. Que consiste na erosão da masculinidade de Adão. No dia seguinte, quando ele chega a arfar com um veado às costas, ela começa, Também, sempre veado, sempre veado, não sabes caçar outra coisa senão veado? Estou farta de comer essa porcaria, já não aguento, todos os dias o mesmo, vê lá se caças uma coisa maior, tipo um alce, ou és demasiado mariquinhas para isso? Adão mantém-se calado antes, durante e depois do jantar, a virilidade acabrunhada e recolhida na sunga de pele curtida, a pensar que de bom grado a deixaria morrer à fome, a cabra, ainda por cima cozinha mal, os veados parecem sempre solas. E ao mesmo tempo põe-se a imaginar se, escondidas nos matagais paradisíacos, não andarão outras evas, quiçá bravo-esmolfe, que o apreciem e lhe dêem o devido valor. O silêncio de Adão contunde com os nervos já precários de Eva (que tem de andar descalça e enrolada em folhas, sem uma manicura ou sequer uma zara nas imediações), que pensa que, por não ter obtido resposta, não foi ouvida. Este é um erro que, depois dela, foi sendo desde sempre cometido pelas mulheres: o de não perceberem que, se os homens não respondem ou não lhes dão a resposta que querem, não é necessariamente porque não tenham ouvido nem queiram saber, mas apenas porque têm o cérebro num diferente comprimento de onda. E muitas vezes nem sequer perceberam a pergunta. Ou a utilidade dela. Então Eva inventa o teatrinho feminino, em que a sua gritaria evolui na proporção directa do mutismo de Adão. Que ele já não gosta dela, que na verdade nunca a amou, que não gosta da árvore que ela arranjou para os dois, que a cena de caçar veados é só para embirrar com ela, que nunca a ouve, que é um egoísta, que nunca vai com ela contemplar o pôr-do-sol. Adão acha aquilo tudo um disparate e que Eva é essencialmente uma ingrata que não aprecia o esforço dele que vem a alancar com os veados às costas até à árvore de morada de família, e começa a ouvi-la como ruído de fundo enquanto acaba de chupar o osso da coxa de um bambi excepcionalmente tenrinho que se perdera da mãe. O seu único neurónio às voltas, a pensar em como se livrar daquela Eva que não fecha a matraca e que não sabe cozinhar. Durante uns tempos, ainda tenta agradá-la e salvar a relação primordial, porque, apesar de ser incapaz de lho verbalizar, gosta dela (é verdade que a falta de opções também ajuda). Mas Eva, definitivamente inoculada com o vírus da raiva, como resposta ao laconismo silencioso de Adão, só consegue depreciar, no que se torna um vício que lhe traz um gozo amargo. Um alce? Mas para que é que a gente quer um alce morto, um bicho tão grande? Depois apodrece tudo e é só larvas. Estás a ver aqui no meio do pomar alguma arca frigorífica?. E assim, enquanto Eva, dando um uso fácil e de arremesso às palavras em excesso, finge odiar Adão, este começa de facto a odiar Eva, embora sem palavras. Às tantas, ele olha-a como uma insuportável galinha tonta que lhe cacareja nas costas o tempo todo e ela, apesar da generosa distribuição de neurónios com que foi contemplada, é no fundo uma parva, porque mantém até ao fim a esperança de que ele um dia lhe diga o que lhe vai na alma. Sem perceber que o que lhe vai na alma é apenas ir comendo umas bravo-esmolfe aqui e ali, ir matando uns alces enquanto solta uns gritos de guerra, e que lhe apreciem a virilidade saliente sob a sunga de pele curtida.
Quem passou pela Faculdade de Direito de Lisboa sabe que o Professor Jorge Miranda é uma criatura completamente desligada da realidade que vive num mundo muito próprio, que se enrola nos cordões dos reposteiros do anfiteatro enquanto dá aulas e que é desprovido de qualquer sentido de Justiça. Se era assim há vinte anos, imagino agora. As suas orais eram sempre uma incógnita, independentemente do que houvéssemos estudado, pois tanto podiam dar para o quinze como para o chumbo, em dependendo do lado para onde estivesse virado e do grau de maluquice e de alheamento do dia. Barra inquestionável no pintelho constitucional, era o típico professor geek de ar perdido e sonhador que as caloiras começavam por achar querido e gostavam de ajudar a guiar-se pelos corredores, mas de quem depressa ganhavam terror, após assistirem aos primeiros ataques de raiva em que se babava e cuspia todo, revelando uma inusitada crueldade perante aquilo que ele achava ser a ignorância alheia. Francamente, não vejo mal no facto de ser próximo do PS (no que me parece uma evidência: não é ele que costuma vir contestar nas televisões a não constitucionalidade de certos diplomas do governo, alegada pelos partidos da oposição?). Queriam que o PS indicasse quem, alguém próximo do PP?, please. Agora, o que não me parece nada bem é escolherem-no para um cargo que (apesar de relativamente inútil) pede algum sentido prático, bom-senso, equidistância, capacidade na gestão de conflitos, ponderação e por aí fora. E não percebo porque é que disto, que é o mais importante (a desadequação daquela desajustada pessoa, em concreto, àquele específico cargo) ninguém fala.
As minhas breves incursões pelo futebol português redundam invariavelmente na perplexidade. Hoje foi dia de Sporting-Benfica cá em casa, tudo comme il faut, acompanhado de minis, acajús, amendoins e tremoços, com uma larga maioria benfiquista um tudo nada boçal e alarve a rodear a beta ligeiramente sportinguista que já aqui referir ser eu própria. Fiz um esforço para me imbuir do espírito, juro. Bebi duas ou três cervejas, apliquei o calão próprio da tribo aos árbitros e a um ou outro jogador e vi (como toda a gente) que foi uma injustiça o Benfica ganhar. Reparei, no entanto, num pequeno pormenor em que já reparara nas outras (poucas) vezes em que me focalizei numa partida de futebol entre dois ditos grandes clubes portugueses: está sempre tudo no chão e em noventa minutos pouco ou nada se joga. Há sempre um jogador, ou no ar ou a rebolar no chão, que se agarra às canelas num esgar de dor, que grita, que chora, que coxeia, que faz queixinhas; e há sempre árbitros a conferenciarem, a escreverem coisas em papelinhos, a ouvirem as queixinhas dos jogadores e a mostrarem cartões a este e àquele; e fiscais de linha num desassossego para trás e para a frente, com as suas bandeirinhas a adejarem; e o jogo constantemente interrompido, os jogadores parados a cuspirem para o ar ou a discutirem uns com os outros ou com o árbitro, que mais parecem umas meninas. E quase nunca ninguém a fazer, por um período decente e corrido de tempo, aquilo que devia estar ali a fazer: a chutar a bola, com jogadas minimamente inteligentes, organizadas e consequentes, na direcção da baliza contrária.
(dizes-me tu e com razão que) está tudo lixado quando concedemos ao outro o direito de nos magoar. É um direito absoluto, um poder sem nuances nem relativismos que entregamos sem condições, num arremedo de cerimónia iniciática do ódio. O direito de o outro nos conseguir magoar. Uma iniciativa graciosa que está na nossa disponibilidade e que se expande na proporção inversa do amor que ainda temos ou que um dia tivemos para dar. Há um momento em que isso acontece, essa concessão tão explícita e óbvia como a assinatura de um tratado, a divisão do mundo ao meio, tu ficas com o direito de me magoar e eu com o dever de lamber-me as feridas. Não é no entanto um direito irrevogável (talvez se salve qualquer coisa).
Hoje, a minha mãe tinha na caixa de correio um anúncio manuscrito que dizia mais ou menos isto: "brasileira de meia-idade oferece-se para todo o tipo de tarefas domésticas. Não roubo marido". A sério: não roubo marido. A propósito de mãe: o meu pai é o melhor do mundo, ponto.