Chegadinha de umas maravilhosas férias frias na praia, do que vai no mundo pouco ou nada sei. Parece que, por cá, uma aluna agrediu uma professora por esta lhe ter tirado o telemóvel e que Cavaco Silva não vai à abertura dos Jogos Olímpicos, disfarçadamente solidário com o povo do Tibete. No primeiro caso, a senhora professora, de acordo com o 24Horas do café aqui da esquina, está "arrasada, coitada", diz o colega professor Charrua (essa vítima do amordaçar da liberdade de expressão), que já lhe telefonou e tudo a consolá-la. Pelo país, multiplica-se a indignação e o povo clama que a aluna, basicamente uma delinquente selvagem, seja expulsa da escola, presa, ou, quem sabe, queimada viva, como no tempo da inquisição. Vejo e revejo o vídeo e, não pretendendo branquear a atitude desta, que deve ser punida de forma proporcional e adequada ao seu acto, cresce o meu desprezo pela professora em questão. Desprezo, aliás, os professores do secundário em geral (como escrevo
aqui : acho-os quase todos uns incompetentes; os que o não são, obviamente, não só não enfiam esta carapuça como concordarão comigo). Entrar em confronto físico com uma adolescente matulona para lhe tirar o telemóvel, provavelmente o seu bem material mais precioso, é de uma enorme estupidez e manifesta a falta de uma data de coisas: de autoridade, de dignidade, de inteligência e de pedagogia. Se um aluno está a perturbar a aula com o telemóvel, de duas, uma: ou o conselho directivo proíbe telemóveis dentro do liceu ou dentro das aulas, assegurando, através do policiamento devido, o tendencial cumprimento da regra, ou, permitindo-os, deverá concertar com os restantes professores a atitude a tomar em caso de prevaricação, que deve ser igual para todos: expulsar o aluno da sala e, eventualmente, aplicar-lhe uma sanção disciplinar. Agora, uma professora entrar em vias de facto com a aluna e tentar tirar-lhe à força o telemóvel , num jogo infantil de "dá cá não dou", é que não lembra ao diabo. Ainda por cima, uma professora "fracalhota", que - desculpem lá! - funciona quase como um "agent provocateur". A de falta de autoridade, sente-se e vê-se: à mulher de César não basta sê-lo, há que parecê-lo. A pouca autoridade moral de quem se quer apoderar pela força de um bem de terceiro, em conjunto com a exibição de (literalmente) uma fraca figura, só podia dar naquele mau resultado. Estranhamente, no entanto, ninguém fala em punir também a professora, que não soube comportar-se com a dignidade de uma professora e que desceu ao nível de uma qualquer coleguinha de carteira da aluna em questão. Quanto a Cavaco e aos chineses, ressalta a falta de coerência destes líderes ocidentais que se reclamam muito humanistas: o país está inundado de lojas e de restaurantes chineses que, presumo, execem legalmente a sua actividade; as importações chinesas são uma realidade, os mais altos dignitários chineses são recebidos em Portugal com pompa e circunstância e as relações políticas, diplomáticas e comerciais entre os dois países estarão, presumo, pujantes. Querem ser coerentes? Então cortem relações diplomáticas com a China, embarguem as trocas económicas, não recebam oficialmente os políticos chineses. A atitude de Cavaco, no fundo, quer dizer isto, nós opomo-nos a que vocês chacinem monges tibetanos, mas não nos opomos assim
muito muito, só nos opomos um bocadinho: o suficiente para rejeitarmos o convite para uma festa. De uma hipocrisia bacoca e provinciana, bem ao jeito do nosso Presidente, aliás.