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Controversa Maresia

um blogue de Sofia Vieira

Controversa Maresia

um blogue de Sofia Vieira

...

por Vieira do Mar, em 27.01.06
Não sejam lorpas


E porque os bons conselhos nunca são de mais (e ainda por cima, são de graça), aqui vai mais um, este especialmente dedicado à malta casada, juntada ou amancebada, embarcada nessa conquista viking que é ter filhos pequenos. Então reza assim, o conselho.

Excepto em caso de doença, pesadelo, tristeza reconhecida notarialmente ou trovoada ribombante, não deixem os vossos rebentos dormirem convosco na cama. Caso não saibam, desde já vos informo que não é o facto de terem filhos em comum que faz de vocês um CASAL a sério perante os deuses, os homens ou entidades intermédias. Não. Precisam também e em especial, de:
porta do quarto fechada + reboliço entre os lençóis + gemidos abafados + risos atravessados + porta do quarto aberta + pésantepés corredor fora + assaltos ao frigorífico às quatro da manhã + líquidos bebidos pelo mesmo copo + dedinhos do outro lambidos com esmero.
Para que tal seja possível, ensinem o vosso filho, desde o momento em que lhe são apresentados, a gostar do seu próprio quarto e a confiar incondicionalmente naquelas quatro paredes. Se preciso for, fiquem lá com ele atéperder o medo ou a manha, deitem-se no chão ou onde for, mas não o deixem invadir um espaço que é vosso ( tal esforço é uma espécie de PPR com benefícios fiscais: acabará por ser recompensado). Caso contrário, preparem-se para um casamento incompleto, frustrado, cortado a meio e noves fora nada.
E pisguem-se sempre que puderem, mas só os dois, não sejam lorpas. Têm avós, tias, amigos, baby sitters, disponíveis para vos aturarem os rebentos durante três dias? Óptimo. Digam-lhes bye-bye sem olharem para trás, sequem a merda da lagrimita que teima em cair, desapertem o coração e façam-se a uma pousada, a um parador, a uma pensão, a uma noite ao relento. Só os dois. De preferência, dêem aos hóspedes do quarto ao lado um bom motivo para se queixarem ao gerente, no dia seguinte. Cheguem saciados, de mãos dadas, sorriso imbecil agrafado no rosto e prontos para pegarem plos cornos mais uns meses de procissão familiar e êxtases em surdina.
E nunca! por nunca, digam orgulhosamente cá eu, não vou para lado nenhum sem os meus filhos, se eu vou, eles vêm também. Desenganem-se: não é por causa disso que são melhores pais, nem que os outros vão achar que vocês são melhores pais. Aliás, são melhores pais, quanto mais felizes forem; para serem felizes, entre outras coisas, têm que se tocar com indecência, têm que se comer como perninhas assadas de frango caseiro e que se chupar um ao outro até ao ossinho; enfim, têm que se amar, pornograficamente, amar.
Por isso, caro/a leitor/a, atentai: se a sua cara-metade insistir para que viajem sempre todos juntos para todo o lado, atreladinhos uns aos outros que nem comboio de feira, desconfie e pense bem na vida. É muito provável que tal signifique que não quer estar a sós consigo, daí BigMacensanduichar os miúdos entre vocês. Eu cá, não sei. Eu cá...

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por Vieira do Mar, em 17.01.06
noves fora, nada



Ele não sabia como lhe dizer que já não aguentava o estarem separados, o não se tocarem e não se verem, o comunicarem-se por interpostos e nos intervalos, através de sinalética intermitente. Tinha gasto as teclas dos telégrafos, dos telefones fixos sem mensalidade e o saldo dos telemóveis sem carregamentos obrigatórios, enviado os pombos-correio de todos os pombais à face da terra e escrito em pedaços de papel com margem e sem margem as mensagens possíveis, as quais enrolara gargalo abaixo de muitas garrafas que atirara ao mar de sargaços que os separava; tinha esgotado os gigas que as caixas de correio electrónicas, generosas, haviam posto ao seu dispor, vogado através das ondas de rádio, usado a energia espírita e os poderes telequinéticos que cozinhara à pressa, no vapor do desejo.

Chegara-lhe, a ela, por murmúrios, em braille, escrito em mil tipos de letra, font mistral arial garamond, tinha-lhe dado música em emepêtrês escolhidos a dedo, letras precisas de mira telescópica, feitas para apontar e irem directasao coração... e ela, longe, lá longe. Tinha-se couraçado de rodeios, meias palavras e deixado levar por entusiasmos de sintaxe, metafóricos e hiperbólicos, embora sem nunca lhe ter efectivamente chegado a dizer amo-te. Sabia quanto pareceria ridículo e lhe soaria a ela a despropósito, a desabafo kitsch, a noivos de santo antónio, novela das sete, rodapé do programa do Goucha, amo-te Sónia, és a mulher da minha vida, Marco, a correio sentimental da revista Maria, a suspiros de doméstica chorosa e de reformada nostálgica; ele, convicto, achava que já não tinha idade para as tremuras quentes, a inconsistência e o desejo gelatinoso e adolescente que, ultimamente, o tomava de assalto pela calada da noite, a meio de uma reunião, quando acordava e punha os pés no chão, enquanto lavava os dentes, assinava uma acta, consultava o saldo no multibanco, beijava a mulher ou estacionava o carro (ele sabia, sabia tudo isso).

Deixara sempre o mais importante por dizer, porque, para além do medo de que fosse verdade, aquela declaração pastiche que teimava em assomar-lhe aos dedos e à boca, temia a reacção dela a essa declaração, o retraimento e a fuga em frente; por isso acabava quase sempre com juras de amizade eterna e desinteressada, despojada de romantismos que obviamente soariam bacocos a ambos, abafando com camadas racionais o som dos violinos ao longe e os votos de paixão que trazia à superfície da pele e queria esfoliar para cima dela, em apanhando-a desprevenida.

Escrevera e dissera muito, tanta coisa!, mas, afinal, ela nunca se dispusera a ler-lhe o amor nas entrelinhas, queria-o escarrapachado à sua frente e alardeado aos sete ventos, pelo que, feitas as contas, tempos depois, foi como se tivesse ficado calado, noves fora, nada.

iôoooo!

por Vieira do Mar, em 13.01.06
O Joãozinho e o seu amigo André, que têm uma banda, inventaram este rap (ler com entoação iooooô e imaginar o primeiro de óculos na ponta do nariz a fazer aquele gesto tipo "cornos para baixo" que os rappers fazem):


A morte bate à porta não sabes quem é

Ficas a pensar na festa que é

Vais à discoteca fazer uma kurte

Vais a casa Vais ao computador

Descobrir a parte do teu dispor.


- Ó João, aquela primeira parte não foram vocês que inventaram, confessa lá, aquilo veio de outra música qualquer...

- Não, não, mãe, essa parte foi o André que inventou, é mesmo inventada.

- Ah! Ok.

-...E a do "computador" foi porque me lembrei de ti...

- Pois, faz sentido (shame on me). E o "dispor", porquê esta palavra?

- Ora mãe, foi só para rimar.


(Portanto: sentido rítmico, boa expressão corporal, plágio parcial descarado, um toque de experiência pessoal baseado num trauma com a mãe, alguma preocupação com a rima... enfim, os rapazes têm futuro.)

o insustentável peso do ser

por Vieira do Mar, em 03.01.06
- Então, Joãozinho, como é que te sentes, agora que já tens seis anos?

- Com mais responsabilidades.

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